AD. Tanquerey – Précis de Théologie Ascétique et Mystique.
Já
dissemos em outro lugar que o melhor remédio contra o orgulho é de reconhecer
que Deus é o autor de todo o bem, e que, por consequência, a Ele só pertence
toda honra e toda glória. De nós mesmos, não somos mais que nada e pecado e não
merecemos senão o esquecimento e o desprezo.
I°
- Não somos mais que nada. Os
principiantes devem estar convencidos na meditação, ruminado lentamente, à luz
divina, os pensamentos seguintes: não sou
nada, não posso nada, não valho nada.
A) Eu
não sou nada: sem
dúvida, quis a bondade divina me escolher entre milhões de possibilidades para
me dar a existência, a vida, uma alma espiritual e imortal e eu O devo
agradecer todos os dias por isso. Mais: a) eu saí do nada, e meu próprio peso
ma arrasta ao nada e eu aí cairei infalivelmente se meu Criador não me
conservar por Sua ação incessante; meu ser não me pertence, mas todo e inteiro
a Deus e é a Ele que devo render homenagem.
b) Este ser que Deus me deu é uma
realidade viva, uma imensa graça, a qual eu não saberei jamais agradecer
suficientemente; mas, por mais admirável que seja, este ser comparado ao Ser
divino, é como o nada, de tal modo é imperfeito. 1) é um ser contingente, que poderia desaparecer sem que nada faltasse a
perfeição do mundo; 2) é um ser
emprestado, que me foi dado sob a reserva expressa do soberano domínio de
Deus; 3) é um ser frágil, que não pode subsistir por ele mesmo e que tem
necessidade de ser sustentado a cada instante por Aquele que o criou. É pois,
um ser essencialmente dependente de Deus e que não tem outra razão de existir
que para render glória a seu Autor. Esquecer essa dependência, agir como se
nossas qualidades fossem completamente nossas, e disso nos vangloriar, é um
erro inconcebível, uma loucura uma injustiça.
Isto
que dissemos do homem na ordem da natureza vale muito mais na ordem da graça
essa participação na vida divina, que faz minha grandeza e minha nobreza, é um
dom essencialmente gratuito que tenho de Deus e de Jesus Cristo, que eu não
posso guardar muito tempo sem a graça divina, que não cresce em mim senão pelo
concurso sobrenatural de Deus. Que ingratidão e que injustiça de atribuir a si
mesmo a menor parcela desse dom essencialmente divino?
B) Eu
não posso nada por
mim mesmo: sem dúvida, recebi de Deus faculdades preciosas que me permitem
conhecer e amar a verdade e a bondade; estas faculdades foram aperfeiçoadas
pelas virtudes sobrenaturais e pelos dons do Espírito Santo; jamais saberemos
admirar perfeitamente esses dons da natureza e da graça que se completam e se
harmonizam tão bem. Mas de mim mesmo, de
minha própria iniciativa, eu não posso
nada para o colocar em marcha e o aperfeiçoar: nada na ordem natural sem o
concurso de Deus; nada na ordem sobrenatural sem a graça atual, nem mesmo ter
um bom pensamento, nem um bom desejo sobrenatural. E, sabendo disso, poderia eu
me orgulhar destas faculdades naturais e sobrenaturais como se elas foram
inteiramente propriedades minhas? Ainda aqui seria ingratidão, loucura,
injustiça.
C) Eu
não valho nada: sem
dúvida, se considero isso que Deus colocou em mim, isso que opera por Sua
graça, sou de um grande preço, tenho um valor: eu valho isso que custei e eu custei o Sangue de um Deus! Mas esta
honra de minha redenção e santificação vem de mim ou de Deus? A resposta não
pode ser duvidosa. Mas enfim, diz o amor-próprio vencido, eu tenho algo,
entretanto, que pertence a mim mesmo e me dá algum valor, é meu livre
consentimento em concurso à graça divina. Seguramente temos ai alguma parte,
mas não a principal: este livre consentimento não é outra coisa senão o
exercício das faculdades que Deus nos deu gratuitamente, e no momento mesmo
onde nós o utilizamos, é Deus quem opera em nós como causa principal: “Ele opera em vós o querer e o fazer”. (Fl
II,13). E, uma vez que decidimos seguir o impulso da graça, quantas vezes
ao contrário nós a resistimos? Quantas vezes nos cooperamos imperfeitamente?
Verdadeiramente, não há ai um motivo para nos vangloriar mas sim para nos
humilhar.
Quando um grande mestre pinta uma
obra de arte, é a ele que se atribui o valor, e não aos artistas de terceiro ou
quarto escalão que foram seus auxiliares. Além disso, devemos atribuir nossos
méritos a Deus como causa primeira e principal, se bem que, como canta a Igreja
conforme Santo Agostinho, Deus coroa Seus dons quando coroa nossos méritos “coronando merita coronas dona tua”.
Assim, pois, de qualquer lado que
consideremos, e seja qual for preço dos dons que estão em nós, de nossos méritos,
não temos o direito de nos vangloriar, mas o dever de fazer homenagem a Deus e
de agradecê-lo do mais profundo do coração. Temos ainda que Lhe pedir perdão
pelo mau uso que fizemos de Seus dons.
II° - Eu sou pecador e como tal mereço o desprezo, todos os desprezos que agradar a Deus me enviar. Para nos convencer disto basta lembra-nos o que dissemos sobre o pecado mortal e venial.
II° - Eu sou pecador e como tal mereço o desprezo, todos os desprezos que agradar a Deus me enviar. Para nos convencer disto basta lembra-nos o que dissemos sobre o pecado mortal e venial.
A) Se tive a infelicidade de cometer um só pecado mortal, eu mereço eternas
humilhações, pois que mereço o inferno. Sem dúvida, tenho a doce confiança que
Deus me perdoou; mas não deixa de ser verdadeiro que cometi um crime de
lesa-majestade divina, uma espécie de deicidio, um suicídio espiritual, e que,
para expiar a ofensa à majestade divina, devo estar pronto a aceitar, a desejar
mesmo, todas as humilhações possíveis, as maledicências, as calunias, as
injúrias, os insultos: tudo isto está bem abaixo daquilo que merece aquele que
uma única vez ofendeu a infinita majestade de Deus. E eu que O ofendi um grande
numero de vezes, qual não deve ser a resignação, minha alegria mesmo, quando
tenho a ocasião de expiar meus pecados por opróbrios de cura duração?
B) Todos nós cometemos pecados veniais,
e sem dúvida, de propósito deliberado, preferindo voluntariamente nossa vontade
à glória de Deus. Isto é uma ofensa à majestade divina, ofensa que merece
humilhações tão profundas que, malgrado uma vida passada na prática da
humildade não poderíamos devolver a Deus toda a glória que injustamente
roubamos. Se esta linguagem parece exagerada, lembremos-nos das lágrimas e
penitencias austeras dos santos que não tinham cometido senão faltas veniais.
Esses santos tinham uma visão mais clara que a nossa e se ainda pensamos
diferentemente deles é por que ainda somos cegos pelo nosso orgulho.
Devemos, pois, como pecadores, não
somente não procurar a estima dos outros, mas nos desprezar a nós mesmos e
aceitar todas as humilhações que agradar a Deus nos enviar.
Grata! Muito bom, e útil.
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